Eu pago, Logo existo
A minha vontade de algo não é medida pela simples vontade, pelo querer, pelo pensar em como fazer, mas sim em quanto eu estou disposto a pagar por uma resposta que alguém aleatório, cheio de nomenclaturas estranhas e auto cunhadas, me oferece.
A minha vontade é um método, não é uma vontade. O sonho é um comércio. Caralho, às vezes penso que tem tanta barreira para as coisas que elas não servem para filtrar, ou pelo menos servir de guarda, mas sim para te cansar, para fazer você desistir antes mesmo de pensar que pode fazer algo.
Como você ousa querer algo sem pensar que tem que comprar um curso avançado sobre aquilo para poder dizer que é especialista em algo?
É como se, para todas as perguntas, sempre tivesse alguém com uma resposta clara e infalível. É a verdade absoluta, o definitivo, o “faça isso que vai dar certo”. Não digo que será fácil, mas vai dar certo.
Porra, que dar certo? O que é dar certo? Dar certo é você ganhar dinheiro com aquilo, poder colar no seu LinkedIn, poder validar tudo o que você queria a partir de um objetivo puramente consumista?
Não sei. Eu me sinto absolutamente confuso, puto, porque eu tenho que pagar não com dinheiro as coisas, mas com a alma. Já que eu posso ser tudo o que eu quiser, desde que eu tenha muito dinheiro.
Aí vejo aquele discursinho do senhor da verdade, o cara que fala que descobriu o segredo dizendo que o lucro dele não é importante, que a real importância é poder ajudar os outros a serem mais. Mas serem mais o quê? Fãs dele?
Tipo, eu fico pensando aqui: qual a diferença do viciado em crack para o viciado em sucesso, em validação, em querer produzir sempre, em querer controlar cada coisa da própria vida, em perseguir um corpo ideal, uma imagem ideal?
É foda entrar nesse tipo de ruminação, ficar pensando o que eu realmente estou querendo, como se o desejo coletivo de que eu produza igual uma máquina entrasse na minha cabeça como um atendente de loja que te puxa pelo braço, fala da promoção e já joga a pergunta: “vamos fazer um cartão?”
E nisso você já está na boca do caixa, sem ter falado não em nenhum momento, mas também sem ter aceitado. O problema é que não houve espaço nem para saber onde você estava, o que estava fazendo.
E aí, quando você se dá conta disso em que foi se enfiando, na hora em que fala que não quer, vem alguém e diz que você não está vendo com clareza o real valor daquilo que está sendo proposto. Que é sua culpa não enxergar que aquela é uma oportunidade única. Você deveria ser grato por ter a chance de estar naquele momento, ali na boca do caixa, sem dinheiro, sem ter ideia do que está acontecendo, e pensando: se é uma proposta, por que eu dizer não ofende tanto?
Se autoconhecimento é tão importante, por que eu ter autoconhecimento suficiente para chegar à conclusão de que não quero produzir porra nenhuma, que não preciso ficar sorrindo para oportunidades esquisitas, faz com que as pessoas não considerem isso autoconhecimento?
É um caralho eu ter que explicar que 5 minutinhos fumando meu cigarro têm o mesmo efeito de uma meditação guiada. A diferença é que no maço de cigarros eu pago R$9, e na meditação, até ser suficientemente entendido para ter efetividade real, eu preciso assistir vídeos, comprar cursos e consumir o que o cara zen, que não precisa se preocupar se vai ter tempo para jantar tranquilo, produz.
Então deixa eu voltar para a minha meditação de filtro vermelho.
Música: Bad Religion – Land of Competition


Eita que o rei de paus tá virado no rei de espadas. Ta brigando com a própria sombra, fio? Por isso é que eu só falo é de mim